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Dito Freitas, o violeiro de Dourados

O que se espera ao chegar à casa de um senhor de 74 anos? Bom, vou acabar com qualquer um de seus “chutes”. Quando cheguei para entrevistar nosso personagem da Gente da Cidade, ele estava construindo uma parte da varanda, sozinho! Com sete décadas de vida, não perde para nenhum jovem pedreiro. Sobe e desce, pega carriola, faz o que for preciso. Esse é o “seo” Dito Freitas, que me pediu alguns minutos para tomar um banho e se arrumar. Quando voltou, aí sim reconheci quem fui entrevistar. De chapéu e viola nas costas , agora ele está pronto para nossa conversa.

Nome completo: Dito Rodrigues de Freitas, nascido em Fernandópolis, São Paulo, no dia 25 de março de 1941. Teve sete irmãos. Logo cedo os pais se divorciaram e ele foi morar em Populina, SP, com o pai, fato determinante para torná-lo quem é hoje.

INFÂNCIA SOFRIDA
Diferente da maioria das histórias, na vida do seo Dito, foi o pai que fez papel duplo, de pai e mãe. Mas como ele mesmo diz “pai não tem jeito para muitas coisas, então foi muito sofrido”. O pai era agricultor e mesmo criança seo Dito ajudava a cultivar milho, arroz e feijão. Também auxiliava serrando madeira.

“Um filho que não tem mãe, não tem zelo, não tem essas coisas de cortar cabelo, por exemplo. Mas eu não me queixo de nada. Nunca me faltou o pão. E meu pai me ajudou a ser o homem que sou. Amadureci logo”.

Ele só voltou a ver a mãe em 1966 quando foi visitá-la. Uma vez só e nunca mais teve notícias dela.

MATO GROSSO DO SUL E A VIOLA
Aos 9 anos ele veio com o pai para Dourados. Continuou ajudando na roça e conheceu seu primeiro e mais antigo amor. Calma, por enquanto não estou falando da esposa. É a viola. Escutava violeiros pelo rádio e se apaixonou. Tratou de comprar o instrumento e aprendeu a tocar sozinho. A primeira música compôs aos 15 anos: Beleza do sertão.

Preciso dizer algo importante, Seo Dito estudou apenas o 1º e 2º anos. Mesmo assim tinha um vocabulário impressionante, prova disso são suas letras. “Aprendi a ler e escrever com a vida. Sei fazer tudo que é conta também. Não passo aperto”.

CONSTRUTOR DE RÁDIOS
Aos 18 anos serviu o Exército, quando voltou, casou. Ah! Ele conta que conheceu a esposa assim: “um sobrinho disse que tinha duas portuguesinhas bonitas na cidade, aí fui até lá a cavalo, me apresentei, começamos a namorar e logo que voltei, casamos”. Já casado, morava em Itaporã, onde viveu por 30 anos, montou uma oficina de consertar televisão e rádio. A paixão pela música já era tão grande que ele também quis fabricar os aparelhos de rádio. “Tinha muito serviço, de manhã consertava, a noite fabricava três rádios por dia”.

100 MÚSICAS
Durante toda a vida, seo Dito, não desgrudou da viola. Sempre arrumava um tempo para tocar. Fazia shows no circo, em festas ou em qualquer canto que alguém o convidasse. Ele já compôs 100 músicas, a maioria, inspirada nas belezas do Pantanal. Gravou três CDs e está preparando o 4º. O novo trabalho deve ser lançado no aniversário de Dourados, em dezembro e se chamará “80 anos! Dourados de todos nós”. Todos os álbuns foram gravados com dinheiro de financiamentos. Para este novo cd sair, ainda falta verba.

“Músico não é valorizado, ainda mais violeiro. O governo tinha que incentivar e não deixar a moda de viola morrer. Encarei isso como uma missão na minha vida. Enquanto eu viver, não vou deixar que a viola morra”.

SONHOS DE UM VIOLEIRO
Está claro que o assunto preferido do seo Dito é a viola, para ele é simples definir essa paixão. “ Viola é raiz, é música que fala no peito das pessoas, principalmente as da roça. Fala das belezas naturais”.

Seo Dito se considera um homem realizado, diz que fez tudo que sempre quis. Mas sonha em ver as modas de viola sendo valorizadas no país.

“As pessoas tinham que viver como um violeiro. Assim o mundo seria melhor. Iriam olhar as coisas bonitas que existem. A viola enche o coração de alegria”.

Por Miriam Névola

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